sexta-feira, 29 de julho de 2011

Justiça ameaça cancelar o maior show do mundo, na Ilha do Retiro, se produtores não recolherem R$ 119 mil em direitos autorais ao Ecad



O juiz de direito Francisco Julião de Oliveira Sobrinho determinou no início da noite desta quinta-feira que os produtores da empresa Caldeirão, que realizam o maior show do mundo, neste sábado, na ilha do Retiro, devem depositar R$ 119 mil a título de direito autoral, sob pena de cancelamento do evento.
De acordo com a decisão judicial, o cancelamento do show ocorre no caso da falta de depósito do valor até às 13:00 hs desta sexta-feira.

Os produtores do evento entraram com um pedido de reconsideração na data de hoje e a decisão do juiz é uma resposta ao pleito. 

“A emenda saiu pior do que o soneto (para o pessoal do Caldeirão)”, afirmou o advogado do Ecad no Recife, Ricardo Uchôa Cavalcanti Filho. "O juiz reconheceu a legitimidade do ECAD em fixar o valor da arrecadação e não o valor que o Augusto Acioli "entende" que é justo".
Ainda de acordo com o advogado, a empresa chegou a oferecer o pagamento de R$ 10 mil em juízo e não foi aceito. 

“Há dois anos, eles pagaram R$ 15 mil. No ano passado, o Ecad verificou o porte e tentou ter uma quantidade mínima de controle, mas os nossos gerentes foram bloqueados no acessso. Nesta ação anterior, considerando um público de 60 mil pessoas, nós pedimos um complemento de R$ 80 mil”, historia.
 
Veja os termos da decisão

PROCESSO Nº 0040637-59.2011.8.17.0001
AUTOR: ESCRITÓRIO CENTRAL DE ARRECADAÇÃO E DISTRIB.- ECAD

RÉU: FESTA CHEIA PRODUÇÕES E PROPAGANDA LTDA

DECISÃO

Trata-se de AÇÃO DE CUMPRIMENTO DE PRECEITO LEGAL COM PEDIDO LIMINAR proposta pelo ESCRITÓRIO CENTRAL DE ARRECADAÇÃO E DISTRIBUIÇÃO - ECAD em face de FESTA CHEIA PRODUÇÕES E PROPAGANDA LTDA.

Em síntese, o pedido inicialmente formulado pelos demandantes em sede de liminar foi no sentido de suspender/cancelar o evento denominado "O Maior Show do Mundo" organizado pela parte ré para a data de 30/07/2011 na Ilha do Retiro Recife/PE.

O fundamento de tal pleito é a falta de recolhimento ao escritório central do ECAD dos valores devidos pela execução do evento a título de direitos autorais.

Em decisão com natureza eminentemente cautelar (fls. 141/142), foi determinado por este juízo o depósito judicial no prazo de 24h da quantia de R$119.200,00 (cento e dezenove mil e duzentos reais), como forma de resguardar tanto o direito dos réus na realização do evento, quanto os direitos autorais a serem recolhidos pelo ECAD.

Ciente da referida decisão, a parte ré apresentou às fls. 149-164 Pedido de Reconsideração da interlocutória, afirmando dentre seus argumentos que não discutem o direito do ECAD no recolhimento dos valores relativos aos direitos autorais, mas tão somente o valor estipulado, uma vez que teria havido um enquadramento indevido na categoria de evento.

De acordo com a parte ré, organizadora do evento, o calculo da cobrança deveria ter utilizado do percentual devido para shows ao vivo, já que no espetáculo não haverá reprodução mecânica.

Aduz ainda que não haveria razoabilidade na fixação de tais valores, mormente quando comparados aos eventos realizados em anos anteriores.

Esse é o Breve relatório, passo a decidir.

A despeito de a decisão desse juízo ter caráter eminentemente cautelar e ter resguardado o interesse de ambas as partes, conforme se verifica de sua fundamentação, é inconteste o direito de petição dos demandados no sentido de pleitear uma reconsideração deste juízo.

Analisando detidamente os autos verifica-se que a parte ré não traz qualquer fundamento que invalide os cálculos efetuados pelos demandantes com base em regulamento próprio aprovado em assembléia geral do ECAD.

No que concerne ao percentual fixado para cobrança previsto no Regulamento de Arrecadação da entidade autora (fls. 65), o mesmo deve ser aplicado em 10% sobre a receita bruta, já que de forma incontroversa se trata de um espetáculo musical ao vivo, com expectativa de público e renda expostos às fls. 47 dos autos, tudo ratificado pelos documentos de fls. 38; 41; 45; 163 e 164 do caderno processual, muitos desses disponibilizados na imprensa e nos autos pelos demandados.

Ademais, a alegação de que o valor não teria razoabilidade e proporcional não merece acolhida, uma vez que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é uníssona em reconhecer a discricionariedade do ECAD na fixação dos valores devidos a título de direitos autorais.

Nessa senda, transcrevemos in verbis alguns julgados daquela corte:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. CIVIL. DIREITO AUTORAL. LEI 5.988/73. SESC. REALIZAÇÃO DE EVENTOS E SONORIZAÇÃO AMBIENTAL. EQUIPARAÇÃO A CLUBE SOCIAL. LUCRO INDIRETO. TABELA DE PREÇOS DO

ECAD. LEGALIDADE. RECURSO DESPROVIDO.

1. "A execução ou a transmissão de composição musical, em clube social, obriga ao pagamento de direitos autorais" (REsp 6.962/PR, Rel. p/ acórdão Min. CLÁUDIO SANTOS, DJ de 17.05.1993), pois ínsito está o lucro indireto.
2. A jurisprudência desta Corte Superior consagrou o entendimento de que o Serviço Social do Comércio - SESC é equiparado a clube social quando realiza eventos para seus associados (devendo ser incluída também a sonorização de ambientes), sendo devidos os direitos autorais oriundos da utilização de obras musicais, havendo ou não a cobrança de ingressos, mesmo sob a égide da Lei 5.988/73, porquanto caracterizado o lucro indireto, com a promoção e valorização da própria entidade recreativa, a qual se torna mais atrativa a novos associados.
3. Este Tribunal Superior já assentou ser válida a tabela de preços instituída pelo próprio ECAD, não podendo o Poder Público, seja por lei seja por regulamento administrativo, ou o Judiciário modificar tais valores em face da natureza privada dos direitos postulados.
4. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no REsp 998928 / RN. Relator Ministro VASCO DELLA GIUSTIN. Data de julgamento 17/03/2011)
"CIVIL. DIREITOS AUTORAIS. BAILE DE CARNAVAL EM CLUBE. ECAD. REGULARIDADE DA REPRESENTAÇÃO. LEGITIMIDADE PARA A CAUSA. VALORES. TABELA PRÓPRIA. VALIDADE. LUCROS DIRETO E INDIRETO
CONFIGURADOS. LEI N. 5.988/73. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULAS N. 282 E 356-STF.
I. A ausência de prequestionamento impede a apreciação do STJ sobre os temas não debatidos no acórdão estadual.
II. O ECAD tem legitimidade ativa para, como substituto processual, cobrar direitos autorais em nome dos titulares das composições lítero-musicais, inexigível a prova de filiação e autorização respectivas.
III. Caracterização de ocorrência de lucro direto e indireto no caso de promoção, por clube social, de bailes de carnaval.
IV. Os valores cobrados são aqueles fixados pela própria instituição, em face da natureza privada dos direitos reclamados, não sujeitos a tabela imposta por lei ou regulamentos administrativos.
V. Precedentes do STJ.
VI. Recurso especial do autor conhecido e provido. Recurso adesivo da ré não conhecido."
(RESP nº 73.465/PR, Rel. Min.Aldir Passarinho Júnior, DJ de 22.08.2005).

"Direitos autorais. Legitimidade do ECAD para fixar os valores. Desnecessidade de indicação das músicas e dos autores.
1. Já assentou a Corte não ser "necessário que seja feita identificação das músicas e dos respectivos autores para a cobrança dos direitos autorais devidos, sob pena de ser inviabilizado o sistema causando evidente prejuízo aostitulares" (REsp nº 526.540/RS, de minha relatoria, DJ de 9/12/03; REsp nº 255.387/SP, de minha relatoria, DJ de 4/12/2000). De igual forma, os valores cobrados são aqueles fixados pela própria entidade (REsp nº 151.181/GO, de minha relatoria, DJ de 19/4/99).
2. Recurso especial conhecido e provido."
(RESP nº 623.687/RS, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes)

No mesmo sentido, fora o entendimento deste magistrado no julgamento no processo de nº001.197.05961-1, com tramite perante a 3ª Vara Cível da Comarca do Recife.

Desta forma, entendo, que o ECAD, na condição de representante dos detentores da titularidade dos direitos autorais, realizou a fixação do preço dentro da discricionariedade reconhecida por nossos tribunais superiores e de acordo com seu regulamento.
Ante o exposto, indefiro o pedido de reconsideração ora formulado,mantendo o entendimento ora atacado, e, considerando a exiguidade do prazo para a realização do evento, determino que a parte demandada deposite até às 13:00h de amanha, dia 29/07/2011, com comprovação nos autos, o valor já fixado (R$119.200,00), sob pena de imediato bloqueio judicial e/ou suspensão/cancelamento do evento, nos termos pleiteados na inicial.
P. I. e Cumpra-se.

Recife, 28 de julho de 2011
Dr. Francisco Julião de Oliveira Sobrinho
Juiz de Direito

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